A educação é um direito humano fundamental
para o desenvolvimento da pessoa e consequentemente do meio social que a rodeia
pois, está cientificamente comprovado que por via do direito à educação é
possível que os cidadãos e as cidadãs alcancem outros direitos fundamentais
para o bem-estar político, económico, social, ambiental e cultural das noções.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos
salvaguarda claramente o direito à educação no seu Artigo 26º, lembrando aos
Estados-Membros que todo ser humano tem
direito à instrução, que deverá ser gratuita e obrigatória, pelo menos nos
graus elementares e fundamentais, que deverá estar orientada para o
desenvolvimento da personalidade humano e para o fortalecimento do respeito
pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais, que deverá promover a
compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e, por isso os pais
têm prioridade de direito na escola do género de instrução que será ministrada
a seus filhos.
Ao subscreverem a referida Declaração, os
Estados-Membros de que, Angola faz parte, reconheceram a importância
estratégica de garantir o acesso à uma educação pública e gratuita para os seus
cidadãos e para as suas cidadãs, como sendo um recurso estratégico para a
promoção da paz, da justiça social e da dignidade humana.
Como mecanismo de operacionalização do
compromisso assumido a nível das Nações Unidas, o Executivo Angola tem
reafirmado o direito humano à educação na Constituição da República de 2010,
precisamente, no Artigo 79º que tanto se refere ao direito ao Ensino como
também à Cultura e ao Desporto. No ponto primeiro do Artigo em referência, o
Estado Angolano promove o acesso de todos
à alfabetização, ao ensino, à cultura e ao desporto, estimulando a participação
dos diversos agentes particulares na sua efectivação, nos termos da lei.
Uma leitura comparada sobre o Artigo 27º da
Declaração Universal dos Direitos Humanos e o Artigo 79º da Constituição da
República de Angola de 2010 revelam seguramente uma coerência do ponto de vista
do papel da educação para a vida humana e consequentemente para o progresso das
nações. Na verdade e em rigor, quanto maior oportunidade de educação for dada
aos cidadãos e às cidadãs, maior possibilidade de se contar com a participação
dos cidadãos e das cidadãs na vida pública e, por conseguinte no desenvolvimento
do país, tendo em conta as habilidades de cada cidadão e cidadã. Portanto, a
garantia do direito à educação para todos os cidadãos e para todas as cidadãs
pressupõe garantir a construção de uma sociedade constituída por elementos cuja
ética e moral está voltada à promoção da dignidade humana.
Do ponto de vista legal (teórico), os dois
instrumentos referidos acima promovem, defendem e protegem o direito à educação
no quadro dos princípios de participação, democracia e exclusividade. Na
prática, será que todos os cidadãos Angolanos e todas as cidadãs Angolanas
gozam do direito à educação pública, gratuita e de qualidade?
A Rede Angolana da Sociedade Civil de Educação
Para Todos enquanto um movimento de advocacia social em prol da promoção e
defesa do direito à educação para todos os cidadãos e todas as cidadãs sem
qualquer tipo de descriminação, pretende, a partir da observação directa e da
leitura crítica de alguns documentos oficiais do Ministério da Educação,
apresentar a sua análise sobre a questão do acesso à educação em Angola à luz
do Marco de Acção de Dakar, que resultou do Fórum Mundial de Educação Para
Todos realizado em Senegal de 26 a 28 de Abril de 2000.
No referido Fórum de Dakar, realizado há 14
anos, os Governos de todo o mundo comprometeram-se uma vez mais garantir para
todos os cidadãos e para todas as cidadãs dos seus países este direito
alienável até 2015, tendo assumido implementar os Seis objectivos de qualidade
de educação, dos quais analisaremos, pormenorizadamente, quatro na perspectiva
de efectivamente responder a questão central desta análise.
Primeiro Objectivo: Estender e melhorar a protecção integral da
primeira infância, especialmente, para as crianças mais desfavorecidas.
Este objectivo significa formular,
implementar, monitorar e avaliar políticas públicas e mecanismos de articulação
entre Governos e Sociedade Civil em prol da prestação de boa assistência e
educação para todas crianças, especialmente as mais desfavorecidas.
As políticas públicas em prol do
desenvolvimento das crianças devem traduzir-se em acções práticas e terem
impacto directo na vida delas, das famílias e das comunidades. Essas acções
práticas que vão desde a criação de infra-estruturas, acompanhamento e formação
das crianças são de extrema importância para a preparação das crianças perante
as circunstâncias da vida, por exemplo, está suficientemente aprovado que uma
criança que passa por um centro infantil tem maior possibilidade de obter
sucesso escolar do que aquela que não passa por esta instituição considerada
como uma das primeiras instituições de socialização de crianças a seguir,
naturalmente, da família.
O Executivo Angolano tem vindo a conceber e
implementar políticas públicas em prol do bem-estar da criança e tem
institucionalizado o Conselho Nacional da Criança (CNAC), um espaço de
articulação multissectorial sobre a problemática da criança.
Apesar de políticas públicas existentes e dos
espaços de articulação entre o Governo e a Sociedade Civil Angolana observamos
em Angola mais centros infantis privados com altas taxas de inscrição e
propinas (que rondam entre 25 a 50 mil Kwanzas) do que centro infantis
estatais. Para ter uma ideia, na Província de Luanda existem menos de 15
centros infantis estatais, mas tem mais de 80 centros privados. Na maioria das
restantes provinciais do País, o número de centros infantis estatais é inferior
a 5 e desse reduzido número encontram-se todos nas capitais provinciais.
Ao nível do Ensino Geral é igualmente
importante prestar-se atenção à classe da iniciação, pois muitas escolas da
rede pública não têm turmas desta classe, considerada de antecâmara para a
socialização da criança em idade escolar na escola. Segundo o Anuário
Estatístico do Ministério da Educação de 2012, o número de turmas de iniciação
foi de 14279, correspondendo a 9008 escolas e tendo apenas abrangido 639088
crianças. A ausência da informação sobre o número de crianças existentes em
Angola, não permite saber o número de crianças exacto ou aproximado que está em
idade escolar, mas fora da escola.
A carência de serviços estatais para a
assistência à primeira infância tem sido, no nosso entender, uma grande
oportunidade de negócio para as entidades privadas, que vão alargando
quantitativa e qualitativamente os seus serviços em todo o território nacional.
Isto não é um mal, antes pelo contrário é uma alternativa importante para os
pais e encarregados de educação. A preocupação sobre a expansão dos serviços
privados de assistência à primeira infância reside no facto de que apenas
crianças de pais ricos ou com possibilidade financeira regular é que conseguem
frequentar estas instituições, tornando a educação como algo exclusivo de
elites e não como um directo humano consagrado tanto na Declaração Universal do
Direitos Humanos e na Constituição da República de Angola de 2010.
Segundo Objectivo: Assegurar que até 2015, todas as crianças,
especialmente, as meninas tenham acesso e concluam a escolaridade primária
gratuita, obrigatória e de boa qualidade.
Milhões de crianças, especialmente meninas não
tem acesso à escola e as poucas que conseguem ter a sorte de ingresso não
conseguem concluir a escola primária por várias razões. Esta realidade não é
exclusiva à Angola, dai ter-se recomendado a todos os Governos estabelecer e
implementar medidas que, por um lado, facilitem o acesso e conclusão da escola
primária gratuita e obrigatória e, por outro, medidas que ajudem a vencer
alguns tabus culturais rumo ao acesso e á conclusão de uma escolaridade de boa
qualidade.
O Governo Angolano estabeleceu e acredita-se
que sempre que possível estabelecerá medias para alcançar o segundo objectivo
de Dakar de que assumiu. Certamente, não vai conseguir alcançá-lo em 2015, data
limite, atendendo que Angola é um dos países da África com muitas crianças fora
da escolaridade.
Segundo o Anuário Estatístico do Ministério da
Educação de 2012, neste ano foram matriculadas em todas as escolas primárias
estatais 4.009.107 crianças e deste número 2.017.576 são do sexo feminino.
De
acordo com os dados referidos acima, nota-se que matricularam-se mais crianças
do sexo feminino do que as do sexo masculino com uma diferença de %. No ano de
2010, o número total de crianças matriculadas no Ensino Primário gratuito foi
de 4.543.998, deste 22.5380 foram do sexo feminino. Portanto, podemos perceber
que o número de crianças que ingressa ao Ensino Primário gratuito tende a
aumentar, sobretudo as do sexo feminino.
Todavia, se por um lado o número de crianças
do sexo feminino tende aumentar ano pós ano nas Escolas Primárias, por outro
lado, são também as crianças do sexo feminino que mais cedo desistem ou
abandonam os seus estudos, facto bastante visível em muitas escolas, sobretudo
as que estão localizadas no meio rural. Os dados do IBEP (2011), provam esta
afirmação: As raparigas entram na escola
na idade correcta em maior percentagem do que os rapazes (55% e 49%,
respectivamente), factor que contribui para uma incidência maior de
escolaridade primária entre as raparigas. Apesar de as raparigas entrarem para
a escola em proporções superiores às dos rapazes, como já foi visto acima, esta
tendência não se mantém ao longo de todo o ciclo escolar. Os dados do ensino
primário revelam uma proporção superior de mulheres com este nível concluído
(62%) comparativamente aos homens (50%). Esta divergência inverte-se nos níveis
seguintes, sendo maior no Ciclo I (com uma diferença de 7% a favor do homens).
Terceiro Objectivo: Assegurar que as necessidades de
aprendizagem de todos os jovens e pessoas adultas sejam satisfeitas através do
acesso equitativo a programas de aprendizagem e de desenvolvimento de
capacidades para a vida adequada.
Por razões de vária ordem muitos jovens e
adultos não tiveram oportunidade de acesso á escola e alguns tiveram-na, mas
não a concluíram. É nesse sentido que muitos Governos se comprometeram com os
todos os jovens e adultos em garantir-lhes a oportunidade de obter
conhecimentos e desenvolver os valores, as atitudes e habilidades que lhes
possibilitem desenvolver suas capacidades para o trabalho, para participar
plenamente na sociedade, para deter o controlo da sua própria vida e para
continuar a aprender.
Com vista a responder este compromisso, o
Governo Angolano formulou e implementou em 2013 algumas importantes políticas
educativas com realce o Programa da Alfabetização e Aceleração do Atraso
Escolar (PAAE), bem como criou a Comissão Nacional de Alfabetização, como um
mecanismo de articulação entre os diferentes departamentos ministeriais e a
sociedade civil para tratar da questão da alfabetização.
De acordo com os dados disponibilizados pela
Direcção Nacional de Educação de Adultos durante o Conselho Consultivo do
Ministério da Educação, que decorreu na cidade do Saurimo, Província da Lunda
Sul, de 19 a 21 de Março de 2014, foram alfabetizados 990.203 jovens e adultos
em 2013, em todo o território nacional, por um corpo de alfabetizadores
estimados em 15.600.
Entendemos que houve um esforço conjugado
entre o Estado Angolano e os parceiros sociais para conseguir alfabetizar
990.203 pessoas adultas, mas este é um número ínfimo para combater a elevada
taxa de analfabetismo calculada em 30% da população Angolana, que se estima em
19 milhões de habitantes de acordo com os dados do último censo eleitoral.
Quarto Objectivo: Melhorar todos os aspectos qualitativos da
educação para conseguir resultados de aprendizagem reconhecidos e mensuráveis.
A qualidade da educação é um conceito que está
em debate na agenda internacional. Especialistas em Educação e activistas
cívicos continuam a buscar consenso sobre o que se pode entender por qualidade
da educação, mas há um pensamento mais ou menos consensual de que deve ser
aquela educação que satisfaz as necessidades básicas de aprendizagem e
enriquece a vida dos educandos e sua experiência global de vida.
O Professor Dr. José Manuel Moran, Especialista em mudança na educação
presencial e à distância, aponta, pelo menos, cinco inegáveis variáveis para a
garantia de uma educação de qualidade, resumidamente: i) Organização inovadora, aberta, dinâmica, projecto pedagógico
participativo; ii) Docentes bem
preparados intelectual, emocional, comunicacional e eticamente. Bem
remunerados, motivados e com boas condições profissionais; iii) Relação efectiva entre professores e alunos que permita
conhecê-los, acompanhá-los, orientá-los; iv)
Infra-estruturas adequadas, actualizadas, confortáveis. Tecnologias acessíveis,
rápidas e renovadas; v) Alunos
motivados, preparados intelectual e emocionalmente, com capacidade de
gerenciamento pessoal e grupal”.
Com vista a responder o compromisso de
proporcionar uma educação de qualidade para todos os cidadãos Angolanos e todas
as cidadãs Angolanas, o Executivo Angolano tem vindo a implementar a 2ª Reforma
Educativa desde 2004, que segundo Pinda Simão, actual Ministro da Educação,
citado pela Agência Lusa em 2004, ela visa
melhorar a qualidade do ensino através de uma estrutura educativa forte e de um
novo projecto educativo baseado em instrumentos curriculares recentes.
Volvidos quase 10 anos desde o início da
implementação da Reforma Educativa, o processo de ensino e aprendizagem praticado
em Angola é ainda questionável, pois muitos pais e encarregados de educação não
se sentem satisfeitos pela educação que é ministrada para os seus filhos.
De acordado com os dados do Relatório
preliminar de Avaliação Global da Reforma Educativa, elaborado pela respectiva
Comissão de Acompanhamento e Avaliação, revela que dos 12.170 alunos da amostra
avaliados, 42% obteve resultados positivos e 58 negativos na disciplina da
Língua Portuguesa, ao passo que na da Matemática 48% de alunos obteve
resultados positivos e 52% resultados negativos. Há mais resultados negativos
do que positivos. As causas são várias e vão desde a necessidade das famílias
melhorarem cada vez mais as condições de vida até ao Governo que deve melhorar
as condições laborais e salariais dos funcionários do sector da educação,
especialmente professores, incluindo acções de capacitação permanente para os
professores e gestores escolares, bem como acções voltadas à auto-estima e
status dos professores.
Pela REDE EPT
Carlos Cambuta
Corodenador da Rede EPT Angola
Bibliografia
- Anuário
Estatístico de 2012 do Ministério da Educação da República de Angola;
- Apresentação
do Ministério da Educação sobre o Desenvolvimento da Educação de Adultos
de 2013;
- Constituição
da República de Angola de 2010;
- Declaração
Universal dos Direitos Humanos;
- Gouçalves,
Jonuel: Monografias Africanas, Outubro de 2012;
- Relatório
do Fórum Mundial de Educação de 2000;
7.
Relatório de
Avaliação Global da Reforma Educativa (RAGRE), 2014.
obrigada
ResponderEliminarobrigado
ResponderEliminarA Associação Angolana para Educação de Adultos (AAEA), Coordenadora da Rede da Sociedade Civil Angolana de Educação para todos (Rede EPT) em parceria com algumas organizações ligadas a Rede tem vindo a um tempo a esta parte, promover workshops junto dos seus membros, no intuito destes obterem ferramentas que possam permitir a estes, uma melhor articulação com os grupos com quem interagem no seu dia-a dia.
ResponderEliminarAssim sendo no quadro de acções do Projecto "Redes de cidadania activa: protecção social, educação e cidadãos para uma cooperação mais eficiente", co-financiado pela União Europeia, vai realizar-se uma oficina sobre Monitorias de políticas públicas cujo objectivo da oficina é de fornecer uma introdução à monitorização de políticas com ênfase a educação, como forma de fazer a diferença nas nossas sociedades.
Os objectivos deste recurso são os seguintes:
• Dar-lhe uma visão sobre monitorização de políticas públicas com ênfase a educação
• Aprender com a experiência dos outros em Luanda/Angola
• Apresentar-lhe novos termos e métodos utilizados em monitorização de políticas
• Apresentar ideias sobre como a sua organização ou rede poderá planear actividades
Os workshops serão realizados nos dias 27, 29 e 31 de Outubro de 2014, nos Distritos respectivamente de Cacuaco, Kilamba Kiaxi e Quissama.
Formidável iniciativa
ResponderEliminarOlá!
ResponderEliminarEstou a elaborar um texto sobre o acesso, tratamento e conhecimento na educação em Angola.
Por favor, gostaria de ter acesso a um dos documentos citados no vosso trabalho: Anuário Estatístico de 2012 do Ministério da Educação da República de Angola